eresa de Lisieux, O.C.D., nascida Marie-Françoise-Thérèse Martin, conhecida como Santa Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face, foi uma freira carmelita descalça francesa conhecida como um dos mais influentes modelos de santidade para católicos e religiosos em geral por seu "jeito prático e simples de abordar a vida espiritual". Juntamente com São Francisco de Assis, é uma das santas mais populares da história da Igreja[2][3][4]. O papa Pio X chamou-a de "a maior entre os santos modernos"[5].
Teresa recebeu cedo seu chamado para a vida religiosa e, depois de superar inúmeros obstáculos, conseguiu, em 1888, com apenas quinze anos, tornar-se freira para juntar-se às suas duas irmãs mais velhas na comunidade carmelita enclausurada em Lisieux, na Normandia. Depois de nove anos, tendo ocupado funções como sacristã e assistente da mestra das noviças, Teresa passou seus últimos dezoito meses numa "noite de fé" e morreu de tuberculose com apenas vinte e quatro anos de idade.
O impacto de sua "A História de uma Alma", uma coleção de seus manuscritos autobiográficos publicados e distribuídos um ano depois de sua morte foi tremendo e ela rapidamente tornou-se um dos santos mais populares do século XX. Pio XI fez dela a "estrela de seu pontificado"[6], beatificando-a em 1923 e canonizando-a dois anos depois. Teresa foi também declarada co-padroeira das missões com São Francisco Xavier em 1927 e nomeada co-padroeira da França (com Santa Joana d'Arc) em 1944. Em 19 de outubro de 1997, São João Paulo II proclamou Teresa a trigésima-terceira Doutora da Igreja, a pessoa mais jovem e a terceira mulher a ter recebido o título na época[7].
Além de sua popular autobiografia, Teresa deixou também cartas, poemas, peças religiosas e orações. Suas últimas conversas foram também preservadas por suas irmãs. Pinturas e fotografias - a maioria de autoria de sua irmã Céline - ajudaram a aumentar ainda mais a popularidade de Teresa por todo o mundo.
De acordo com um de seus biógrafos, Guy Gaucher, depois de morrer "Teresa foi vítima de um excesso de devoção sentimental que acabou por traí-la. Foi vítima também de sua linguagem, que era a do fim do século XIX e que fluía da religiosidade de sua época". A própria Teresa disse, em seu leito de morte: "Eu amo apenas simplicidade. Tenho horror a pretensão". Ela também se manifestou contra o estilo de escrita de algumas vidas de santos publicadas na época, "Não devemos dizer coisas improváveis ou coisas sobre as quais nada sabemos. Devemos enxergar suas vidas reais e não imaginárias"[8].
A profundidade de sua espiritualidade, que ela qualificou como "toda de confiança e amor", inspirou muitos crentes. Confrontada com sua própria pequeneza e irrelevância, confiava em Deus para ser sua santidade. Queria ir para o céu de uma forma completamente diferente: "Quero encontrar um elevador que me eleve até Jesus" e o elevador, escreveu Teresa, eram os braços de Jesus retirando-a de toda a sua pequeneza.
A Basilica de Lisieux é o segundo mais popular destino de peregrinação na França depois do Santuário de Lourdes[9]
Os pais de Teresa
Santa Zélie Martin. Em junho de 1877, Zélie viajou para
Lourdes na esperança de ser curada, mas o milagre não ocorreu.
"A Mãe de Deus não me curou por que meu tempo acabou e por que Deus deseja que eu descanse em outro lugar que não na terra".
Santo Louis Martin.
"Era um sonhador e incubador, um idealista e romântico... Para suas filhas, deu apelidos inocentes e ternos: Marie era seu 'diamante', Pauline, sua 'pérola nobre', Céline, 'a corajosa'... Mas Teresa era sua 'petit reine', a 'pequena rainha', a quem todos os tesouros pertenciam."[10] Teresa nasceu na Rue Saint-Blaise[11], Alençon, na França, em 2 de janeiro de 1873, filha da santa Marie-Azélie Guérin, chamada geralmente de Zélie[12], uma bordadeira[13], e do santo Louis Martin[14], um joalheiro e relojoeiro[15], ambos devotados católicos. Louis havia tentado se tornar um clérigo secular do Hospício do Grande São Bernardo, mas foi recusado por não conhecer nada de latim. Zélie, que tinha um temperamento forte e ativo, desejava servir aos doentes e também considerou dedicar-se à vida consagrada, mas a prioresa das clérigas regulares do Hôtel-Dieu (a "Santa Casa") de Alençon ignorou seu pedido[16]. Desapontada, aprendeu a bordar e teve muito sucesso, abrindo seu próprio negócio na própria rua Saint-Blaise[17] com apenas 22 anos.
Louis[18] e Zélie[19] se conheceram no início de 1858 e casaram-se em 13 de julho do mesmo ano na Basílica de Notre Dame de Alençon[20]. Ambos muito piedosos, levavam uma vida confortável. Decididos a princípio a viverem uma vida de irmãos, em perpétua abstinência, foram desencorajados por seu confessor e acabaram tendo nove filhos. Entre 1867 e 1870, perderam 3 bebês e Hélène, uma menina de cinco anos e meio. Todas as cinco meninas sobreviventes tornaram-se freiras depois:
- Marie (22 de fevereiro de 1860), carmelita em Lisieux, rebatizada "irmã Maria do Sagrado Coração", morreu em 19 de janeiro de 1940.
- Pauline (7 de setembro de 1861), tornou-se "Madre Agnes de Jesus" no Carmelo de Lisieux; morreu em 28 de julho de 1951.
- Léonie (3 de junho de 1863), chamada "irmã Françoise-Thérèse", tornou-se uma visitandina em Caen; morreu em 16 de junho de 1941.
- Céline (28 de abril de 1869), carmelita em Lisieux, rebatizada "irmã Geneviève da Santa Face", morreu em 25 de fevereiro de 1959.
- Teresa (Thérèse), a caçula.
Zélie ganhou tamanha notoriedade com seus bordados[21] que, já em 1870, Louis havia vendido sua relojoaria[22] para um sobrinho e passou a ajuda-la na contabilidade e na logística do negócio[23].
Logo depois de seu nascimento, em janeiro de 1873, eram poucas as esperanças de que Teresa sobreviveria. A enterite, que já havia levado quatro de seus irmãos, acometeu-a também e ela teve que ser entregue aos cuidados de uma enfermeira, Rose Taillé,[24], que já havia tratado antes duas crianças dos Martin. Ela tinha seus próprios filhos e não podia viver com a família e, por isso, Teresa foi morar com ela num bosque em Semallé[25]. Em 2 de abril de 1874, uma Quinta-Feira Santa, Teresa, com apenas 15 meses de vida e recuperada, voltou para sua família em Alençon. Durante toda sua infância, foi educada numa atmosfera profundamente católica, que incluia missas diárias às 5:30, estrita observância de jejuns e orações que seguiam o ritmo ditado pelo ano litúrgico. Os Martin praticavam também a caridade[26], visitando doentes e idosos e ocasionalmente recebendo mendigos à mesa do jantar. Mesmo quando Teresa não se mostrava a garotinha "modelo" que suas irmãs depois fizeram crer, respondia bem a esta educação. Brincava frequentemente fingindo ser uma freira e chegou, certa vez, a desejar que sua mãe morresse pois desejava para ela a felicidade do Paraíso. Geralmente descrita como sendo uma criança feliz[27], era também muito emocional e reclamava muito. Conta Gaucher: "Céline está brincando com a pequena com alguns tijolos... Tenho que corrigir a pobre bebê que faz assustadoras birras quando não consegue o que quer. Rola no chão em desespero acreditando que tudo está perdido. Às vezes tão inflamada que quase chega a engasgar. Ela é uma criança muito nervosa". Aos 22, já uma carmelita, Teresa admitiu: "Eu estava longe de ser uma garotinha perfeita"[28].
Em 28 de agosto de 1877, Zélie Martin morreu de câncer de mama com apenas 45 anos de idade. Seu funeral foi celebrado na basílica de Notre Dame de Alençon[29]. Desde 1865 ela já vinha reclamando de dores nos seios e, em dezembro de 1876, um médico contou-lhe sobre a gravidade do tumor. Na primavera do ano seguinte, sentindo a proximidade da morte, Zélie escreveu para Pauline: "Você e Marie não terão dificuldades para criá-la. Ela tem um comportamento tão bom. É um espírito escolhido." Teresa tinha apenas quatro anos e meio, mas a morte da mãe causou-lhe um impacto tamanho que ela afirmaria depois que "a primeira parte de sua vida acabou naquele dia". "Todos os detalhes da doença de minha mãe ainda me acompanham, especialmente suas últimas semanas na terra" afirmou. Ela se lembrava do quarto onde Zélie, já moribunda, recebeu a extrema unção enquanto ela própria estava ajoelhada a seus pés e seu pai chorava. Continua o relato: "Quando mamãe morreu, minha postura alegre mudou. Eu era altiva e aberta; tornei-me retraída e irritadiça, chorando se alguém olhasse pra mim. Só ficava feliz quando ninguém me notava... Era apenas no seio de minha própria família, onde todos eram maravilhosamente gentis, que eu conseguia ser mais eu mesma"[30][31].
Três meses depois da morte de Zélie, Louis Martin deixou Alençon[32], cidade onde passara sua juventude e se casara, e mudou-se para Lisieux, no departamento de Calvados, na Normandia, onde o irmão farmacêutico de Zélie, Isidore Guérin, vivia com sua esposa e duas filhas, Jeanne[33] e Marie. Em seus meses finais, tomada pela dor, Zélie havia abandonado seu negócio de bordados e, depois que ela morreu, Louis vendeu-o. Em seguida, alugou uma bela e espaçosa casa de campo, Les Buissonnets, que ficava num grande jardim na encosta de uma colina próxima da cidade. Lembrando do passado, Teresa considerava a mudança para Les Buissonnets como o início de "um segundo período da minha vida, o mais doloroso dos três: ele se estendeu dos meus quatro anos e meio até os quatorze anos de idade, a época em que redescobri a minha infância e passei para o período sério da vida"[34]. Em Lisieux, Pauline assumiu o lugar da "mama" de Teresa - uma atribuição que levou bastante a sério - e as duas ficaram muito próximas. Teresa também se aproximou bastante de Céline, que era quase da mesma idade.